Primeira postagem em 2006.
Viver é uma arte...
A arte de lutar para manter convicções e atitudes coerentes e aprender a lidar com o outro, driblar circunstâncias, saborear diferentes sentimentos. A arte de oscilar reflexões sobre certo, errado, seguro, duvidoso, negociável e eterno.
Quando era ainda adolescente, a Igreja Batista do Bairro onde eu morava, costumava receber grupos de missionários americanos para conhecer e ajudar na “evangelização” do povo brasileiro. Fiquei com eles por quase 15 dias, ajudando com o idioma. Ao se despedir de mim, uma das missionárias (já uma senhora) me entregou um bonito pacote de presente onde havia uma linda bolsa de cetim preto.
Ao me presentear, muito amorosa e expressando grande gratidão pela ajuda daqueles dias, ela me comentou:
“
É uma simples recordação, mas não é nova... Era minha.
Onde fui criada, aprendi que, quando damos o que é nosso, demonstramos ainda maior afeição. Assim, queria que você soubesse do amor e gratidão que Deus colocou em meu coração por você nestes dias.”
Deus nos deu o fôlego de vida, e nos falou sobre essa afeição “de dar o que é seu” quando enviou Jesus.
“No princípio era o verbo”, o verbo é o sentido de todas as coisas, é o sentido da vida. É a arte.
“O verbo estava com Deus” – o dom da vida estava com Deus e era Deus.
“O verbo se fez carne e habitou entre nós” – A vida se fez carne para melhor entender as carnes que não entendiam a vida!
Jesus foi um presente que pertencia a Deus. Era Deus feito gente. Uma coisa totalmente sua, que Deus nos deu.
Pensando com a filosofia da adorável missionária, eu fico sem palavras ao refletir...
Que afeição!!!!! Realmente uma “maneira tal de amar”!
A vida é uma arte que é “meio nossa”, mas que não nos pertence, o que, talvez, seja uma boa desculpa para a irresponsabilidade humana.
Incerta e misteriosa, a vida é um projeto surpreendente e desafiador, e essa nossa impotência diante de sua grandeza, de certa forma, nos incomoda.
Romanos 14, vs 7,8,9 diz:
“Nós não somos donos de nós mesmos,
de forma a vivermos ou morrermos segundo a nossa vontade ou conveniência.
Quer vivamos, quer morramos, somos do Senhor, dependemos da sua vontade. Quando morrermos, iremos estar com o Senhor. Por isso, tanto na vida como na morte, pertencemos ao Senhor.
Foi para isto mesmo aliás que Cristo morreu e ressuscitou, para ser Senhor das nossas vidas, quer vivamos, quer morramos”
Como eu disse antes, a vida é uma arte que é “meio nossa” - uma coisa que a gente tem, mas que ironicamente não nos pertence. Contudo, vale pensar que é um presente de afeição inigualável, e deve ser tratado com cuidado especial, e não irresponsável.
Relembrando Shakespeare, em Hamlet:
“Há mais mistérios entre o céu e a terra
Do que supõe nossa vã filosofia”
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P.S.: Só para não se perder na mente, e parecer meio irreal, quero dizer que tenho a bolsa de cetim até hoje. Estou com 42 anos, e ainda sinto o perfume da época na bolsa...
O afeto que veio com a bolsa permaneceu e cresceu. Ainda hoje, sempre que posso, falo com os missionários por e-mail. Trocamos fotos e atualizamos os filhos, netos (deles), etc. Já estão bem idosos e cansados, mas falam comigo ainda como se ainda fosse aquela garotinha...
Por Beth_Bittencourt