quinta-feira, setembro 09, 2021

Fé, Religião e Política

 

Passei por muitos caminhos de reflexão nos últimos anos, e, boa parte deles, dentro de um ambiente religioso. Hoje, reconheço o que bem disse o poeta Antonio Machado em seu CANTARES: "Caminhante não há caminho, se faz caminho ao andar". O processo de elucidação, autoconhecimento ou espiritualidade acontece em nós enquanto vivemos, conforme nossas experiências, nossa predisposição de alma, nossa sede de pertencimento no cosmos, e nossa solicitude ao divino. E isso pode se dar dentro ou fora de uma religião.

O que tem acontecido no campo visível da podridão político-religiosa não tem nada a ver com a essência de uma fé genuína, da busca por conhecer e experimentar Deus.

Fé, religião e política é uma relação altamente prostituída, no pior sentido da palavra.

Mas isso não é de agora não, sempre foi assim. Aliás, de acordo com a história do Cristianismo, por exemplo, esse era o “grande sugador de energia” de Jesus. Seu tempo em forma de gente nesse plano foi para resgatar princípios e valores nas intenções e ações que nascem em nós, e nos instruir por inspiração e direcionamento do espírito que soprou sobre nós, pois aparentemente, nos perdemos na experiência humana. Nesse tempo, o que dele sabemos foi que viveu de forma pacífica, mas não passiva; que tinha eloquência para estar entre os doutores da lei, mas vivia entre pescadores; que andava com feridos, desprezados e marginalizados, que nunca usurpou poder ou glória para si, que usou as crianças como exemplo de pureza, e surpreendeu líderes religiosos, rompendo com tradições e hábitos que não priorizassem o amor.
A partir dessa sinopse, é absolutamente contraditória a linha de pensamento cristã-religiosa atual com a prática do Cristo a quem dizem seguir.

 

Igreja e Estado sempre tiveram um envolvimento inescrupuloso, interesseiro, e abusivo. A questão é que a variedade de “personas” no mercado religioso se multiplicou absurdamente, e isso pulverizou as teorias e promoveu uma produção em série de ídolos carnais esvaziados de valor. Por incrível que pareça, a impressão que eu tenho é que, no passado, Igreja e Estado tinham interesses mais evidentes na disputa pelo poder. Hoje, os estereótipos de fé trazem uma cortina de fumaça sobre as reais intenções. Fato é que isso não é novo. O que me frustra é a recorrência tão potencializada, em pleno Século XXI. Inacreditável que tenhamos chegado até aqui com tanto acesso à informação e conhecimento, e, ainda assim, haja espaço para propagação dessa “aura” do mal.

 

Deus é atemporal, eterno, insondável, transcendente, e inesgotável em ser. Ele não precisa do meu conceito a respeito dele para existir. Ele simplesmente é. Tentar decifrá-lo é quase exaustivo, não fossem os mistérios que nos colocam vulneráveis a experimentá-lo na dimensão genuína, pessoal e intransferível da fé de cada um de nós.
Portanto, é plenamente legítimo ter uma ideia de Deus. Mas o que vemos hoje não tem a ver com isso, o que vemos, e que se repete historicamente, tem a ver com um branding de fé, com logo, identidade visual, e público devidamente estabelecido; tem a ver com a comercialização de um conceito que deveria ser santo; tem a ver com a profanação do sagrado. Isso sim é um pecado*.

Certamente Deus recebe com amor nossa tentativa de decifrá-lo, seja como for, mas deve desprezar a ufania de quem torna isso um produto, com embalagem, branding e custo.

 

*  OBS: A palavra pecado deriva do latim ‘peccatum’, que remete a “tropeçar, dar um passo em falso; enganar-se”.


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