Esse nome - BigBrother - foi inspirado num livro - ¨1984¨,
de George Orwell.
1984 é o título do livro, que foi lançado em 1949, e foi o
último de Orwell antes dele falecer. Eu li 1984 em pleno ano de 1984. Estava na
faculdade. Nada mais indicativo do que analisar a obra no ano que dá nome a
ela. Em 1984, o livro já fez sentido, hoje, então, daria pra fazer uma
dissertação específica só sobre isso! Mas 'bóra' seguir.
O livro não é uma proposta de Reality Show, obviamente. Ele pode ser considerado como DISTOPIA, que seria mais ou menos um contraponto da UTOPIA. Enquanto a utopia você lida com um sonho ideal, mundo cor de rosa (e azul, rsrsrsrs), com arco íris e pote de ouro debaixo dele, a distopia é um imaginário com uma pitada forte de infelicidade, angústia, medo, solidão, e fatalidades. A gente conhece bem esse gênero em diversas obras cinematográficas de ficção.
A história é ambientada numa região “X” do mundo,
provavelmente próxima de onde vivia o autor (Grã Bretanha), num futuro imaginário (já que
foi escrito em 1949).
No livro, Big Brother é um dos personagens centrais da trama (O Grande
Irmão). Ele é o líder de um governo déspota, autoritário, que não pode ser
contrariado. Tem muitos outros personagens interessantes obviamente - o
protagonista (Wiston Smith), que narra a história, a mocinha por quem ele se interessa, que é reacionária, e um falso camarada, que, na verdade, é um
traidor infiltrado; enfim, é uma história com um cunho sócio político
fortíssimo.
O que nos remete à analogia do BBB é que eles vivem nessa
região fictícia, vigiados o tempo todo pelo que o autor chama de TELETELA - uma tela (tipo uma TV), presente em
todas as residências, que não pode ser desligada, apenas ter seu volume diminuído,
pq ela serve tanto para transmitir as informações ditatoriais do governo,
quanto filmar tudo que acontece dentro das casa.
Bom, eu ficaria horas falando sobre o livro porque é
extremamente interessante, e muito atual, embora tenha sido escrito há mais de
70 anos. O que nos faz ver que algumas coisas não mudam, e que o bicho homem é
mesmo uma coisinha previsível, influenciável, e, dependendo do tamanho do ego,
o próprio demônio.
Sugiro a leitura, porque vale a pena. Mas e o nosso BBB?
Bom, o primeiro carinha a ter a brilhante ideia de montar uma paráfrase esvaziada de conceito da obra de Orwell foi um Holandês, se não me engano, nos idos dos anos 90. Depois, as emissoras, interessadas na audiência do programa, foram “comprando” o direito e replicando o seu formato. Daí, então, chegamos ao BBB - que é o BigBrotherBrasil.
Eu não tenho paciência para reality show. Para mim, só o fato de uma pessoa saber que está sendo filmada já compromete a legitimidade do que é mostrado em 99%. Por muito tempo, eu fui inclusive militante contra o BBB. Na minha cabeça, era como se colocassem um monte de gente numa jaula, e me fizesse abrir mão do meu tempo precioso para assistir pessoas se expondo, muitas vezes, sem um mínimo de conteúdo, o que não me acrescentaria nada.
A minha opinião não mudou de todo, mas houve um reajuste de
pensamento, um aprendizado pessoal.
Meus filhos cresceram, hoje são jovens adultos, e, ao longo da nossa convivência, eu precisei mesmo rever muitos conceitos, em relação ao meu modo de olhar a vida, o comportamento social, e minha rigidez de posturas e de opiniões temporais.
Aos poucos, fui partilhando do mundo que eles vivem, e
percebendo cada dia mais que uma caminhada familiar saudável deve ter troca de
experiências, aprendizado recíproco, e muita discussão, obviamente. Educar é um
processo com prazo de validade, inspirar é uma coisa mais contínua e duradoura,
mas a noção de certo e errado acontece
na relação pais e filhos até um determinado momento, depois, o que fica é o
suco do que se construiu, é o amor envolvido, e os valores pregados e
praticados. Depois que os filhos crescem, vivenciamos desafios diários de
gerações, opiniões, e outras coisas mais.
Quando percebi que gostaria de manter essa troca com meus filhos, eu comecei um exercício de autoconhecimento, de flexibilizar pensamentos, de ressignificar minhas verdades pessoais. Foi muito saudável, melhorei como pessoa, e sigo caminhando. Foi aqui, então, que comecei a considerar assistir BBB com minha filha, para poder continuar conversando com ela sobre tudo, e ter legitimidade nos meus argumentos.
Paralelo a isso, uma das atividades no meu trabalho passava por mentoria com um time de profissionais jovem, com quem estabeleci uma relação de afeto, e, no andar do processo de mentoria. Muitas questões pessoais eram trazidas, e me davam oportunidade e permissão para orientar, e compartilhar minha experiência. Uma das meninas da mentoria me trouxe o assunto BBB, e me surpreendeu com um comentário: “você deveria assistir BBB como suporte para seu trabalho com pessoas, Beth. O que acontece lá, eu vejo frequentemente acontecer no nosso dia a dia”. Nesse dia, voltei pra casa pensando, juntei com muita coisa que ouvia dos meus filhos, e cheguei a uma conclusão: Qual tinha sido a última vez que eu havia flexibilizado uma ideia rígida minha, saindo da minha supremacia do correto?
Obviamente, nossos valores costumam ser inegociáveis, mas
ali, não era uma questão de valores, era uma questão de leitura de vida, de
investimento intelectual, de opinião. Eu não estava indo matar, enganar ou
trair alguém; e também me dei conta de quem eram as pessoas que estavam tendo essa
argumentação comigo, da abordagem e da base da nossa relação. Por que ser tão
inflexível diante de uma situação tão leve, de terreno agradável e fértil?
Como estava no início da 20a edição, joguei a toalha, e abracei a
vida fútil de telespectador de BBB.
Foi muito bom. O Reality Show? Não necessariamente. Este
ficou dentro do esperado. O que foi muito bom foi a minha experiência de fazer
algo fora do meu script, e o descortinar dos meus olhos para um mundo que não
acontecia dentro dos meus parâmetros, de minhas interações seletas, minha
intelectualidade, e meus achismos, mas que fazia parte da não limitação humana - positiva e negativamente falando; e que extrapolou para o universo paralelo das
redes sociais, com a mesma “pegada”, ou seja, naveguei por perfis nunca dantes
navegados a partir de comentários e hashtags relacionados ao BBB e seus
participantes.
Saldo: positivo.
Deixei de ser ativista CONTRA para ser A FAVOR? Não! Sigo achando que tem muita coisa melhor para se produzir para as mídias, mas, reflito cada vez mais sobre aceitar que não sou o centro do universo, nem a última bolacha do pacote, que “há gosto pra tudo”, e que sou apenas mais uma. Se quiser fazer a diferença, preciso estar envolvida. Analisar inevitavelmente, flexibilizar algumas vezes, e aprender sempre.
Quero saber continuar, parar e voltar atrás; mas nunca
estagnar.
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